Cozinhar com crianças: uma viagem sensorial

Embarcar na aventura de cozinhar com crianças é desvendar um mundo de sabores e sensações, um caminho cheio de descobertas que pode ser particularmente transformador para os mais pequeninos com seletividade alimentar.

Convidar as crianças para a cozinha é muito mais do que preparar refeições é convidá-las a explorar um mundo de sensações e abordar de forma  lúdica e natural as barreiras da seletividade alimentar e uma estratégia para promover uma alimentação mais consciente e diversificada. 

Este artigo é uma viagem a um mundo de experiências sensoriais na cozinha, onde cada sabor, textura, aroma e cor desempenham um papel fundamental na forma como as crianças percebem e aceitam os alimentos.

Ao entender como estimular esses  e outros sentidos em atividades com as crianças, podemos abrir um leque de possibilidades para os pequenos aventureiros do paladar, incentivando-os a experimentar e a desfrutar de uma variedade mais ampla de alimentos.

A cozinha pode ser um laboratório sensorial, onde os pequenos podem tocar, cheirar, provar e, acima de tudo, brincar com os alimentos.

Esta abordagem não só desperta a curiosidade e o interesse por novos sabores, mas também fortalece a relação das crianças com a comida de uma maneira positiva e saudável.

Preparados para descobrir como transformar cada refeição numa aventura excitante que vai além do paladar? 

A cozinha como espaço de aprendizagem sensorial

A cozinha, como um espaço educativo, oferece oportunidades únicas para o desenvolvimento sensorial das crianças.

Durante os primeiros anos é fundamental a estimulação dos cinco sentidos: visão, audição, tato, olfato e paladar . Cada um destes sentidos é um canal vital para a aprendizagem e o entendimento do mundo, incluindo o universo da alimentação.

Visão: Aproximadamente aos seis meses, as crianças começam a perceber melhor formas e cores, sendo atraídas por elas. Na cozinha, esta estimulação visual pode ser potencializada através da apresentação de alimentos coloridos e variados, criando um ambiente visualmente estimulante .

Tato: O tato é desenvolvido através do contacto com diferentes texturas e temperaturas. Na cozinha, as crianças têm a oportunidade de tocar e sentir diversos alimentos, compreendendo suas características físicas .

Audição: A audição é um sentido que, além da dimensão física, envolve a atenção. Sons como o crocante de um biscoito ou o borbulhar de uma panela contribuem para a experiência culinária e ajudam as crianças a desenvolverem a sua percepção auditiva .

Olfato: O olfato é um sentido altamente sensível e especializado, influenciado por vários fatores como o ambiente e experiências prévias. A cozinha é um local rico em aromas diversos, desde o odor fresco de frutas até o cheiro aconchegante de pão no forno .

Paladar: Finalmente, o paladar é estimulado ao experimentarem diferentes sabores, aprendendo a distinguir e apreciar uma variedade de alimentos. Este sentido é especialmente relevante na cozinha, onde as crianças podem experimentar diretamente os resultados das suas criações culinárias.

Gosto e Sabor. Qual é a diferença?

O universo da alimentação infantil pode ser muito rica em sabores e gostos. É importante compreender a distinção entre estes dois conceitos para ensinar às crianças a entender melhor as sensações provocadas pelos alimentos.

Gosto: Os cinco básicos

O gosto é a sensação primária que ocorre quando um alimento entra em contato com as papilas gustativas na língua, e estas enviam a informação para o cérebro.

O paladar humano é capaz de identificar cinco gostos básicos:

1. Doce:

• Origem: Geralmente vem de açúcares presentes em alimentos.
• Alimentos: Frutas, mel, e alimentos açucarados.

2. Salgado:

• Origem: Principalmente do sal, composto por sódio, um mineral essencial para o corpo.
• Alimentos: Sal marinho, azeitonas, queijos e alimentos processados.

3. Ácido:

• Origem: Ácidos orgânicos como o cítrico, málico e láctico.
• Alimentos Exemplos: Frutas cítricas, iogurte, e vinagre.

4. Amargo:

• Origem: Compostos variados, muitos dos quais são antioxidantes.
• Alimentos Exemplos: Folhas verdes, café, e cacau.

5. Umami:

• Origem: Glutamato, um aminoácido encontrado naturalmente em vários alimentos.
• Alimentos Exemplos: Tomate, queijo parmesão, cogumelos, carnes, e molho de soja.

Sabor: Uma experiência multissensorial

Por outro lado, o sabor é o resultado da junção entre olfato, tato e o gosto. É uma percepção mais complexa e envolve até mesmo influências externas, como o ambiente, a memória afetiva e o humor. O sabor começa com o aroma dos alimentos e é influenciado pela sua temperatura e textura .

Explorar o gosto e sabor com as crianças

Na alimentação infantil, é fundamental explorar tanto o gosto quanto o sabor. Isto pode ser feito através de atividades lúdicas e educativas que envolvam os cinco sentidos.

Um exemplo prático é o "teste do rebuçado de mentol”, onde as crianças podem primeiro sentir apenas o gosto doce com o nariz tampado e, ao destapá-lo, experimentar o sabor completo do rebuçado. Esta atividade simples, mas eficaz, ajuda as crianças a entenderem como os sentidos do paladar e olfato trabalham juntos para criar a experiência do sabor .

Ao compreender a diferença entre gosto e sabor, as crianças podem desenvolver uma apreciação mais profunda pelos alimentos que comem. Esta compreensão ajuda não só na identificação de sabores e gostos, mas também na formação de hábitos alimentares saudáveis e diversificados.

Dicas para estimular os sentidos na cozinha 

Estimular os sentidos das crianças desde a infância é uma maneira de envolvê-las na cozinha e a aceitar melhor todos os alimentos, contribuindo para uma alimentação mais consciente.

Aqui vão algumas dicas divertidas e educativas que podem ajudar:

• Aventura nas compras: Transforme a ida às compras numa aventura sensorial. Deixe que as crianças toquem, cheirem e até provem alguns alimentos. Pergunte-lhes sobre as cores, texturas e aromas. Isso não só torna a experiência divertida, mas também as ajuda a entender melhor os alimentos.

• Jogos de adivinhas com alimentos: Em casa, organize um jogo onde as crianças tapam os olhos e tentam adivinhar os alimentos pelo cheiro, textura ou sabor. Isso aguça os sentidos e torna a aprendizagem sobre alimentos uma brincadeira.

• Cozinhar com as crianças: Envolver as crianças na preparação das refeições é uma maneira prática de ensinar sobre os alimentos. Deixe-as ajudar a lavar os vegetais, misturar os ingredientes e cortar alimentos com facas adequadas para crianças.

• Histórias de alimentos: Conte histórias sobre a origem dos alimentos ou crie narrativas envolvendo os ingredientes. Isso pode despertar a curiosidade e o interesse das crianças.

• Jardinagem doméstica: Se possível, cultive alguns alimentos em casa. Pode ser algo simples como ervas em um vaso. Deixe as crianças cuidarem e observarem o crescimento. Isso ensina paciência e responsabilidade, além de conectar a criança ao processo de onde vem a comida.

• Explorar novos sabores: Incentive as crianças a experimentarem novos alimentos regularmente. Faça isso de forma lúdica, por exemplo associando a alimentos dos seus desenhos favoritos ou criando um 'dia da novidade' da semana para experimentar um novo alimento.

• Criar receitas: Estimule a criatividade permitindo que as crianças ajudem a criar receitas. Isso pode ser tão simples quanto escolher quais frutas colocar numa salada de frutas ou quais vegetais adicionar a uma pizza.

• Diário alimentar: Para crianças mais velhas, manter um diário alimentar com anotações e desenhos sobre as experiências culinárias pode ser uma maneira divertida de refletir sobre os diferentes sabores e texturas que experimentaram e criar um repositório de experiências, sensações e receitas.

Estas atividades não só estimulam os sentidos alimentares das crianças, mas também promovem momentos significativos em família e contribuem para uma relação saudável e consciente com a comida desde cedo.

Em resumo...

A cozinha, um espaço familiar em todas as casas, revela-se um cenário extraordinário para a exploração sensorial das crianças.

Cada atividade, desde sentir a textura da farinha até ouvir o som borbulhante de uma panela, oferece uma oportunidade única de estimular os sentidos e promover a curiosidade e a aprendizagem.

• Exploração sensorial como ferramenta educativa: Utilizar os cinco sentidos na cozinha não é apenas divertido, mas também uma ferramenta educativa poderosa. Esta abordagem prática permite que as crianças aprendam sobre alimentos, nutrição e ciência de uma forma que os livros didáticos simplesmente não conseguem fornecer.

• Estimulação dos sentidos e desenvolvimento cognitivo: A cozinha é um laboratório para o desenvolvimento sensorial. Estimular a visão, audição, tato, olfato e paladar das crianças enquanto cozinham ajuda no seu desenvolvimento cognitivo, além de promover uma compreensão mais aprofundada e alimentação mais consciente.

• Superar desafios alimentares: Para crianças com seletividade alimentar, a cozinha torna-se um local de descoberta e experimentação. Através da exploração sensorial, as crianças podem ultrapassar suas resistências alimentares, abrindo-se para novos sabores e texturas de uma forma divertida e controlada.

• Segurança e criatividade: É essencial priorizar a segurança enquanto se incentiva a criatividade. A cozinha proporciona um ambiente seguro para as crianças explorarem, criarem e aprenderem, sempre sob supervisão e com utensílios de cozinha adaptados às suas mãozinhas.

A cozinha, mais do que um espaço para preparar refeições, transforma-se num parque de diversões sensorial para as crianças, um local onde podem aprender, explorar e crescer.

Ao encorajar a exploração sensorial na cozinha, estamos não só a enriquecer a experiência alimentar das crianças, mas também a estabelecer as bases para uma relação saudável e duradoura com a comida e a nutrição.

Para mais dicas sobre como envolver as crianças na cozinha, leia o artigo Primeiras aprendizagens na cozinha